2 de janeiro de 2012

O TÚMULO DO DIREITO MORTO.


2011 terminou com o Judiciário em recesso.

2012 começa com o Judiciário em recesso.

365 dias tem o ano judicial, com 52 sábados e 52 domingos, sobram 261.

261 menos 60 de férias e 20 de recesso, sobram 181.

181 menos 7 feriados nacionais e por baixo 1 estadual e 1 municpal, sobram 172.

172 menos 2 dias na semana santa e 2 no carnaval, sobram 168.

168 dias trabalhados em turnos de 7 horas.


Os cálculos podem estar imprecisos mas pouca diferença faz.

Enquanto a sociedade clama que a 'justiça' é lenta e pouco eficaz, a 'justiça' se queixa da falta de meios e do 'excesso' de postulações e demandismo profissional e protelatório.

Pelo lado do demandismo temos que todos demandam dentro do permitido pela lei.

Pelo lado do excesso de postulações temos apenas direitos feridos em busca de curativo.

Pelo lado da falta de meios temos um histórico vilão: o barbante.

O barbante já existia no século XV, era feito de cânhamo (cannabis) e evoluiu para o algodão mais abundante e menos fumável.

O barbante serve para 'apensar" os autos, isto é, para amarrar os volumes de documentos judiciais uns aos outros. É o 'penso', ou atadura, de 'atar' ou 'vincular'.

O século XXI chegou e o barbante continua apensando autos.

Enquanto a mente do terceiro milênio se ocupa com as coisas que irão acontecer a mente judicial parece se ocupar em manter as coisas como sempre foram.

A mente nova se baseia em poder de processamento e poder de solução e tem fundamento simples: todo raciocínio é analógico mas toda decisão é digital (sim ou não, zero ou um).

A mente judicial ainda não entendeu que não lida com empate, logo, todas as decisões judiciais são digitais, apenas a fundamentação delas é analógica, ou subjetiva como gostam de dizer. Porém, o raciocínio analógico é vetorial, ou seja, cada passo do raciocínio aponta para o sim ou para o não, logo, a conclusão é uma soma vetorial, o que Aristóteles (384-322 antes de Cristo) percebeu e formulou na simplicidade do silogismo.

A completa ausência do ensino das lógicas (ginástica mental), principalmente da lógica jurídica, transformou o que deveria ser uma soma vetorial em "morada do poder", visível na fala de um ministro do STF que queria os autos do mensalão para ler, como se na mais alta corte não existissem analistas de informação ou os existentes não merecerem confiança.

E o poder 'individual' continua abrigado na indestrutível fortaleza do subjetivismo e do formalismo.

Pelo processo, para o processo, com o processo e no processo.

Amém, o processo precisa terminar bem mesmo que o Direito nele postulado tenha morrido enforcado pelo barbante que há pelo menos cinco séculos 'apensa' os autos.

Processos bem feitos servindo de túmulo para direitos mortos.

Serrano Neves - Procurador de Justiça rumo ao zero.

Ilustração de: omundocomoelee.blogspot.com

Um comentário:

Pascoal disse...

É bastante reflexivo esse texto. Tenho muito para pensar, ainda mais vivendo num país onde a corrupção está institucionalizada. Tudo em troca do PODER. Este é o legado que lamentavelmente deixamos para os nossos filhos, sem o menor constrangimento.
Esta semana os jornais noticiaram a morte de uma mãe que teve o seu estado de saúde agravado depois da prisão do filho contraventor. Imagino que desgosto para essa mulher.
O fato é que adotamos uma forma impura de governo: a Corrupção, instituída pelos "netinhos" de Lenin. E ela está brotando em todos os lugares.
A obsolescência do barbante faz-se necessária para à instrumentalização de morosidade dos processos. Assim as raposas ganham tempo para tramar a invasão do galinheiro.