23 de julho de 2012

SISTEMA PRISIONAL: MAIOR UNIVERSIDADE DO BRASIL


SISTEMA PRISIONAL: MAIOR UNIVERSIDADE DO BRASIL

O texto é de Luiz Flávio Gomes, publicado na Carta Forense de julho de 2012, pág. B-8, e não destoa do conceito popular de que as prisões são escolas de aperfeiçoamento no crime.

Do ponto de vista socioambiental um estabelecimento penal não é diferente de outro estabelecimento, ou lugar, no qual as pessoas são confinadas voluntária ou compulsoriamente por menor ou maior intervalo de tempo, como escola, quartel, estádio de futebol, transporte coletivo etc.


Tais lugares tem regras de conduta desejadas, controladores dessas regras e uma "lógica" própria criada pelas pessoas confinadas e, quanto mais tudo isso se afasta dos padrões do "meio livre" maior o esforço das pessoas para se adaptarem e conviverem com o mínimo de conflitos.

Quanto maiores as injunções do convívio e quanto menores as habilidades que o confinado tem para a vida "livre" socialmente aceita, mais o socioambiental se torna crítico e estressante.

Os criminosos são confinados com o propósito contraditório de prepará-los para a liberdade privando-os dela, como se a um time de futebol estivesse sendo preparado para o jogo com privação do treinamento e preparação física.

A adaptação do condenado ao "estabelecimento" e ao convívio depende de que se adapte a tudo, ou seja, que torne-se um "prisioneiro", assim como alguém se adapta a um transporte coletivo lotado, trânsito engarrafado, salas de aula sem conforto etc.

Aprender com os experientes é uma prática corrente e o tempo de permanência acaba por moldar o comportamento para o convívio e moldar a mente a partir dos padrões da "mente comum" dos internados.

Um estabelecimento penal é uma plataforma socioambiental altamente crítica, no limite do estresse físico e mental dada a escassez de recursos encontrados no meio livre.

A preconizada separação dos condenados em grupos homogêneos serviria para evitar o convívio entre variados graus de criminosidade e especialidade criminosa, minimizando qualquer aprendizado de coisas criminosas novas, e seria um facilitador da promoção de condições para a harmônica integração social do condenado.

Harmônica integração significa que não estava integrado, merecendo, então, ser educado como se educam as crianças e tratados como se tratam os enfermos, no pensamento e letra de Luis Jimenez de Asua.

É histórico que por não saber educar ou tratar pessoas que estão fora do padrão sejam criados os confinamentos, como era feito nos tempos bíblicos com os leprosos (Num 5:2 - Ordena aos filhos de Israel que lancem fora do arraial a todo o leproso, e a todo o que padece fluxo, e a todos os imundos por causa de contato com algum morto.)

Os leprosos bíblicos eram reunidos em locais especiais para evitar o contágio com os sãos, dado que a lepra - parece que já sabiam disto - é uma doença de propagação tipicamente socioambiental para a qual, na época, não existia tratamento e controle como existe hoje.

Com os aidéticos aconteceu, inicialmente, a biblificação na forma de confinamento, o que foi descartado quando se descobriu que a transmissão não ocorria apenas entre os imundos (grupos de risco), podendo acontecer por transfusão de sangue entre "gente limpa".

Lepra e aids agora sob regimes de prevenção e tratamento tais que já é anunciada para breve a imunização que permitirá um convívio socioambiental sem preocupações com o contágio.

De regra doentes muito graves são internados em UTIs os menos graves em enfermarias e os de pequeno potencial frequentam ambulatórios, mas todos recebem tratamento para suas doenças.

Imaginem comigo um hospital de internação compulsória no qual os pacientes se misturam (e misturam suas doenças) e não recebem tratamento, podendo ocorrer o agravamento do estado dos pacientes por contágio do convívio ou por "infecção hospitalar".

Com toda certeza, após o tempo de confinamento durante o qual era esperada a cura espontânea, o doente egresso tera "aperfeiçoado" sua doença.

Por outra via acabei de descrever um estabelecimento penal onde nada é feito para tratar os condenados das suas doenças de desvio de conduta e ainda lhes é propiciado um ambiente de "infecção prisional" capaz de adoecer o mais são dos internados que, por força da "lógica" houve por adaptar-se aos meios e modos e às idéias circulantes para sobreviver até o dia da soltura. Simplesmente sobreviver é a meta, dado que nenhum outro proveito existirá.

Até parece que são todos loucos - todos os que cuidam do penal e sua execução: sistemas prisionais ineficazes, mais polícia nas ruas para prender mais gente, mais crimes e penas mais graves, e a idéia de que o egresso, tal qual um monge, purificou o espírito e a mente durante o tempo de isolamento no "mosteiro".

Na verdade, de regra, os egressos elevaram seu grau de criminosidade e retornam para o meio livre portadores de comportamentos socialmente indesejáveis e ocorre a chamada reincidência ou reiteração, que não é nada mais nada menos do que a realimentação da criminosidade e da criminalidade, conquanto não seja o confinamento uma condição necessária para que qualquer pessoa se submeta à extorsão de um "flanelinha" como socialmente aceita ou meta a "mãozona" no dinheiro público com toda a força, o que também é socialmente aceito e consagrado por reeleições.

Enfim, como está está muito bom, pois existe uma "industria" que liga o crime ao combate ao crime e que também proporciona a todos a oportunidade de locupletar-se em algum grau, ficando os "honestos" com a crítica de que o são por conveniência moral tão somente.

É, se faltam hospitais a polução rejeitará que sejam construídos presídios.

É, se falta moradia, alimentação e trabalho dignos para parcela da população, esta rejeitará que isto seja dado aos criminosos.

Conclusão: quanto ao crime estamos na idade média e não sabemos.

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