15 de fevereiro de 2012

QUEREM CALAR PIU-PIU


Piu-piu (Tweety) é um personagem de desenhos animados, um estilizado canarinho amarelo, que inspirou o nome da rede social Twitter cujas mensagens tem, no máximo, 140 caracteres, qual seja: um pio, ou piado, como no canto de uma ave.

O piu-piu cibernético tem a fantástica propriedade de difusão por replicação entre grupos de "pássaros" quando o piado atrai algum interesse, permitindo que um único pássaro ponha em funcionamento uma enorme rede de comunicação totalmente informal, visto que cada interessado replica para seu grupo e os interessados do grupo replicam para seus grupos em espantosa velocidade e alcance.


Essa formidável propriedade começa a assustar o governo que, através da Advocacia Geral da União, quer calar o tuiteiros que divulgam operações policiais, em especial as "blitzes" da lei sêca, por via da extinção de suas contas no Twitter.

A iniciativa se enquadra - como penso - como mais uma tentativa do governo de exercer o controle da sociedade ao extremo limite quando a sociedade contraria seus interesses, e é um passo para a dominação total.

Governança, ou capacidade governativa (do inglês governance), segundo documento do Banco Mundial (1992) refere-se aos resultados das políticas governamentais e a maneira pela qual o governo exerce o seu poder, e é o termo apropriado a ser utilizado quando se quer fazer entender ações estatais que envolvem a sociedade como um todo, e difere de governabilidade que é termo apropriado para referir-se às condições sistêmicas do Estado, sua estrutura e relações.

Governo é poder, e a Constituição diz que todo poder emana do povo, e diz mais que a maneira como tal poder deve ser exercido é o regime democrático (art. 127). Assim, o povo delega o poder através de eleições e espera que seus representantes exerçam o poder com a menor gravosidade possível para os delegantes, sobrando para o povo exercer diretamente os poderes que não foram delegados, como no caso maior do júri.

A governabilidade no Brasil tem se caracterizado pelo que chamo de impotência instrumental, qual seja: as estruturas e as relações não tem instrumentos eficazes para o finalismo de suas funções, e o governo não consegue fazer o que até "as pedras" sabem que deve ser feito.

Enfim, grosso modo: sabe o que quer, sabe o que fazer, sabe como fazer, mas não consegue fazer.

Impotência instrumental é expressão reservada para designar a disfunção do cidadão do sexo masculino que sabe o que quer, sabe o que fazer, sabe como fazer, mas não consegue fazer porque seu instrumento não tem a potência necessária.

A impotência instrumental tanto é motivo de vergonha para os machos quanto propulsora da violência compensatória que descamba em terríveis crimes com motivação sexual mas sem resultado sexual efetivo.

Venho empregando a expressão para designar a motivação da "violência institucional" que é aplicada sobre os cidadãos para compensar a deficiência estrutural e operacional, principalmente no estabelecimento da ordem governativa.

A ciência médica inventou o viagra e seus congêneres para tratar a impotência instrumental, e a "ciência" governamental não perdeu tempo com pesquisa e desenvolvimento, pois lançou mão do direito penal para compensar suas disfunções.

A enxurrada de leis penais ou dispositivos penais embutidas em leis civis mostra a clara tendência de, em não resultados sociais adequados através de mecanismos de governabilidade, dotar a governança de extraordinários poderes em relação às políticas e modo de exercício.

Não conseguindo educar os condutores para a segurança do trânsito o governo criou crimes de trânsito ou os agravou, e agora quer fechar as contas de tuiteiros que difundem as blitzes sob o argumento de que prejudicam as ações de segurança, dando uma declaração formal de que é impotente para promover as segurança por meios conformes ao regime democrático.

Virar a Constituição de ponta cabeça é mais fácil do que cumprí-la.

Regime democrático é a maneira como o governo deve exercer o poder, é o pilar central da governança.

Regime democrático é o poder exercido com a menor gravosidade possível para os governados.

A solução de menor gravosidade em relação aos tuiteiros que divulgam as blitzes é o governo demonstrar o dano e processar cada um, o que na verdade seria uma loucura.

Responsabilizar o provedor da tuitagem (Twitter) parece ser solução tão fácil quanto a do marido que, traído pelo vizinho no sofá da sala, destruiu o sofá.

Todo poder emana do governo, que o exerce contra o povo na medida da sua impotencia, em desconformidade com a Constituição.

Assim acontece na China em relação à internet e em outros países em relaçâo às mídias em geral: é necessário calar aqueles que tem a ousadia de mostrar a incapacidade governativa.

O direito à liberdade de expressão já foi discutido "ad nauseam" e o que falta é respeitar esse direito.

Como diz o professor Omar Motteiro: o único prazer que se tem no poder é o abuso que dele se pode fazer, pois o resto é cumprimento do dever.

Pai, afasta de mim esse cale-se, ou cálice, como trocadilhou foneticamente Chico Buarque.

Imagem paraorkut9.com

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