13 de maio de 2013

O DIREITO DE CONFESSAR


O DIREITO DE CONFESSAR

O direito do acusado ao silêncio, como garantido na Constituição (art. 5º, LXIII), tem como seu par, numa relação de bipolaridade e implicação necessária, o direito de confessar.

A relação pode ser expressa graficamente como um segmento de reta, ou um traço: numa extremidade está o silêncio absoluto e na outra a confissão.
No intervalo entre as duas extremidades está o interrogatório.



Interrogar é fazer perguntas a uma pessoa (inter = junto de, entre; rogo = perguntar) presente, ou, atualmente, entre pessoas conectadas por um meio de comunicação, tal como a vídeo conferência. (Art. 187, CPP)

Confessar é reconhecer a culpa (fateor = reconhecer a falta; con+fateor = reconhecer, confessar) e é ato unilateral, espontaneo (sponte = vontade, motu proprio).

O argumento de que a confissão pode ocorrer dentro do interrogatório é correto, mas sempre será confissão dentro do interrogatório, caracterizando-se por alguma declaração sobre a culpa pelo que é imputado, e não apenas sobre a responsabilidade.

Culpa é palavra reservada para o mal-feito e confissão de culpa é reconhecimento do mal-feito, ou seja, a responsabilidade moral pertinente à dignidade da pessoa que confessa.

Resposta às perguntas do interrogatório são referentes à responsabilidade pelo fato, ou simples autoria (responsabilidade causal), sem pertinência moral e por vezes desnecessárias diante de prova bastante.

Grosso modo, perguntado se praticou o fato narrado na denúncia o interrogado pode responder simplesmente "sim" (responsabilidade causal), mas pode responder "sim, sou culpado", ou "sim, não soube me controlar" ou outra expressão adjunta que revele algum aspecto moral.

O conteúdo moral da norma penal é subjacente ao direito e na norma já integrado como valor, diferentemente do conteúdo moral da confissão, que é pertinente ao "indivíduo" sujeito à imposição de sanção e, deste modo, para o fato narrado o conteúdo moral pessoal é indiferente - salvo nas hipóteses em que opera como eximente.

O conteúdo moral da norma penal (valor integrado ao fato) é universal e se resolve no dolo do tipo, ou no tipo de culpa (Art. 187, CPP, "sobre os fatos") , enquanto o conteúdo moral da confissão resolve-se no art. 59 do CP, em especial na culpabilidade - potencial consciência do injusto. (Art. 187, CPP, "sobre a pessoa do acusado")

Para efetuar a medida da culpabilidade o magistrado deve indagar sobre o conteúdo moral dos elementos que a compõe, mas isto não significa confissão, ou seja, é mero ato de conhecimento.

A confissão deve situar-se "para além" do que seria necessário como resposta às perguntas, e é neste particular que assume seu papel fundamental de "matéria de defesa pessoal".

Na configuração atual o interrogatório acontece após a instrução, sem que durante esta o acusado tenha tido a oportunidade de submeter ao contraditório a sua defesa pessoal, e é neste aspecto que a ampla defesa é fragilizada pois o defensor não pode arguir matéria de natureza pessoal (salvo se tiver mandato expresso e específico para confessar), em resumo: matéria de confissão não pode ser arguída pelo defensor sem que "antes" tenha sido exposta pelo defendido.
O direito de confessar quando exercido no mesmo ato de interrogatório pode trazer à luz matéria nova que necessite de contraditório. Conquanto ao magistrado comandado oferecer a oportunidade de confissão (Art. 187 &2º, III, CPP, "se tem algo mais a alegar em sua defesa" não existe, como regra, que o interrogando receba esclarecimento (o que o defensor ou o promotor poderiam fazer) de que é o momento para confessar , ou narrar sua versão pessoal.

Trazida matéria nova relevante haverá cerceamento de defesa caso a instrução não seja reaberta, ou seja: prejuízo para o acusado ou para o processo.

Como garante da ampla defesa não recomendo "brigar contra a máquina judicial" quando da existência de alternativa que implemente o direito de confessar.
As alternativas sugeridas, respeitada a tática da defesa, são:

1) requerer que a confissão seja tomada por termo nos autos antes do início da intrução (Art. 199.  A confissão, quando feita fora do interrogatório, será tomada por termo nos autos, observado o disposto no art. 195.);

2) levar o defendido a confessar por escritura pública e juntar com a defesa preliminar ou pelo menos antes do início da inquirição das testemunhas;
3) tomar a confissão do defendido no corpo da procuração.

Quanto à terceira sugestão poderá ser dito que o teor é "mentiroso", mas será mentiroso tanto quanto a mesma mentira dita de viva voz ao juiz pelo confitente. Verdade ou mentira, a confissão será valorada conforme a limitação imposta ao magistrado (Art. 197, CPP) mas aproveitado dela o que for relevante como motivos favoráveis e para a análise dos elementos da culpabilidade.

Repetindo: matéria de confissão não pode ser arguída pelo defensor sem que "antes" tenha sido exposta pelo defendido.

Assim, é recomendável que, na primeira oportunidade, o defensor faça juntar a confissão de seu defendido para que possa arguir o conteúdo durante a instrução, não devendo confiar que haverá solução favorável para o defendido no momento do interrogatório pois o processo é a Justiça Pública contra o Indivíduo, exigindo que o equilíbrio de forças seja buscado em alternativas admitidas no direito ou mesmo na legislação subsidiária, para efetividade da garantia constitucional (Art. 5º,; LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;)

De acordo com as regras de interpretação caso o texto fosse limitante a limitação haveria de ser expressa, logo, meios e recurso inerentes à ampla defesa são todos aqueles admitidos pela ordem jurídica e no regime democrático, independentemente de arrolados na lei ou "aceitos" pela jurisprudência.

O remédio contra a não admissão de meio ou recurso inerente à ampla defesa é o mandado de segurança pois nenhum direito será mais certo e mais líquido do que uma garantia constitucional expressa.

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