12 de julho de 2012
EXECUÇÃO PENAL SOLIDÁRIA
EXECUÇÃO PENAL SOLIDÁRIA
Tramita o PL 1069/2011 que propõe alterar a Lei de Execução Penal no sentido de que preenchidas as condições exigidas na lei o condenado receba o benefício ou seja solto, imediatamente, sendo o juiz da execução responsabilizado criminalmente se não o fizer.
O PL define os benefícios como direitos subjetivos mas trata a soltura em tom menor: simples colocação em liberdade.
Minha experiência em execução penal, iniciada em 1985 tão logo a LEP entrou em vigência, foi lastreada nas mesmas fontes que orientaram os autores da reforma, singularmente Francisco de Assis Serrano Neves que me legou sua biblioteca.
Tenho que a corrente humanista norteou o projeto original, dado o que li em Jason Albergaria e na magistral afirmação de Luis Jimenez de Asua de que os réus devem ser tratados como são tratados os enfermos e educados como se educam as crianças.
A execução penal tem por fim, conforme a LEP, cumprir os dispositivos da sentença e promover condições para a harmônica integração social do condenado, conquanto, quase trinta anos depois os condenados ainda não sejam chamados de integrandos.
Para entender de execução penal é preciso entender de liberdade, dado que o objeto é a privação da liberdade. De modo simples: o Estado-jurisdicional priva o indivíduo de determinados exercícios de liberdade por tempo certo e restaura tais exercícios, na forma legal, sempre que o condenado apresentar os sinais de integração social, ou promove a restituição plena do exercício socialmente permitido e aceito com o decurso do tempo ou implementação das condições impostas na sentença.
A impotência instrumental, porém, não permitiu que a materialidade executória promovesse a harmônica integração social, resumindo a execução em mero curso de tempo que se tenta aumentar porque o tempo não integrou o condenado.
Assim como entram, saem, se não saem piores do que entraram.
A primeira demonstração da impotência instrumental foi a desobrigação do exame criminológico para efeito de benefícios - o que na verdade deveria ser feito no início da execução como diagnóstico para o "tratamento".
A segunda demonstração de impotência instrumental é retratada no PL em tramitação: a necessidade de lei para "dar a cada um o que é seu".
O eixo em torno do qual desenvolvi teórica e materialmente a execução penal consistiu em tomar a liberdade do indivíduo como um bem do qual o Estado-jurisdicional não se apropria, apenas limita o exercício na forma da lei, a mesma lei que assinala as condições em que as limitações devem cessar, e tais condições - objetivas e subjetivas - são a causa legal da limitação e tais são pertinentes ao poder-dever do Estado-jurisdicional, ou de forma simples: o Estado-jurisdicional impõe a limitação se e somente se existir causa legal (poder) e faz cessar a limitação sempre que a causa legal não mais existir (dever).
A lógica é negativa: causa legal para a execução penal é a inexistência das condições estabelecidas na lei como indicadores de integração social.
Desta sorte tratei de cuidar que o Estado-jurisdicional "devolvesse" a liberdade nos graus e formas previstas na lei sem a necessidade de requerimento do condenado, de seu Advogado ou de qualquer outra pessoa, quebrando o paradigma histórico - onde atuei como promotor - da "contra-execução" consistente em judicializar o recebimento da prestação devida pelo Estado-jurisdicional.
A quebra do paradigma exigiu "potencia instrumental" que foi materializada na forma do "processo eletrônico" de execução penal - denominado Execpen, concebido na década de 1990 e em operação até hoje - que automatizou a apuração dos tempos e condições de modo a permitir o gerenciamento das "devoluções" ao tempo certo, e de tal modo que pela primeira vez em Goiás o indulto de Natal pode ser concedido para que o indultado passasse o Natal com a família.
Agora, vem ai nova lei dizendo que o Estado-jurisdicional deve cumprir a lei e isto ainda não é o "fim da picada" pois o PL acena que com responsabilização administrativa, civil e penal, com tempo de cadeia para o juiz que não o fizer.
É o Direito Penal do Direito Penal.
O Judiciário não tem instrumentalidade para gerenciar a execução penal e nunca a buscou porque mais confortável responsabilizar o Executivo que não informou, o Advogado que não requereu ou o próprio condenado que não gritou.
Quando de rebeliões em presídos é comum aparecer na TV condenados sacudindo as grades e gritanto pelo Juiz Corregedor. Eu nunca vi tais gritando pelo Governador, qual seja, os condenados tem a consciência de que a execução penal é judicial mas o Judiciário parece não ter a mesma consciência, ou seja, o Judiciário não está "integrado" na execução penal e o legislador deveria estar "promovendo condições para a harmônica integração executória do judiciário" ao invés de ameaçar executores e juízes com o relho da lei.
Punir o coxo porque claudica é o "fim da picada". Dar ao coxo a capacidade deambulatória deseja tem custo e custos crescentes que partem de uma "muleta básica" e vão até a prótese ou cirurgia, tudo conforme o grau de dignidade que se ser conferir, tanto ao condenado quanto aos executores e magistrados, todos pessoas humanas.
Estamos no Brasil, dia seguinte à cassação de um senador que fraudou o mandato e no todo dia em que um flanelinha extorque um dono de carro.
A fraude aos "propósitos" é uma picada para a cadeia, deixar de promover a execução penal na forma da lei uma nova picada sendo aberta para a cadeia, mas de espantar é a idéia de que começará a ocorrer a fraude para escapar da cadeia: bota na rua, o resto não interessa.
Bota na rua ao tempo certo e o mundo aplaudirá o zeloso trato para com a liberdade.
Como histórico, coisa para inglês ver.
Como histórico, projeta-se que haverá lei para fazer cumprir a lei que manda cumprir a lei, ou a imposição de cláusula de solidariedade entre os executores e magistrados com os condenados.
Cadeia pagando cadeia.
E viva o bóson de Higgs!
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