PLANO DE EFICÁCIA DA SENTENÇA CRIMINAL CONDENATÓRIA
A sentença criminal condenatória tem dois planos de eficácia: a) o plano processual no qual reflete que o magistrado examinou os autos e declarou na conformidade das exigências da l ei; b) o plano executório no qual o seu conteúdo não mais depende dos autos, visto que passa a integrar o título de execução penal.
No plano processual o conteúdo mínimo da sentença deve consistir em um encadeamento lógico de proposições e conclusões que permita ao leitor acompanhar o juízo efetuado, passo a passo.
Se 'A' conduz a 'B' e 'B' conduz a 'C' então 'A' conduz a 'C' e é possível concluir por 'ABC'.
O parágrafo anterior refere-se à redução do discurso a uma forma lógica, ou seja: os argumentos A, B e C são conteúdos existentes nos autos, e a conclusão ABC uma declaração do magistrado com fundamento nos argumentos (conteúdos) conhecidos.
Nesta era em que a automação e o tratamento da informação chegaram para auxiliar a inteligência humana, provendo-a de meios para lidar com grande quantidade de informações e relações entre elas, o 'subjetivo' tão alegado pelos que cuidam de entender um conjunto de informações e emitir uma conclusão não pode continuar sendo entendido como um "poder pessoal" ou como "íntima convicção" ainda que motivada.
O raciocínio sempre terá um acento de subjetivismo, ou pessoalidade, dado que cada pessoa possui um corpo de conhecimentos próprio e uma constante de deformação da percepção e, por mais que queira raciocinar de forma "isenta" estará informado pelas "coisas" nas quais acredita, sejam essas de natureza científica, cultural ou religiosa, dado que tais coisas informam os "valores pessoais".
A isenção no raciocínio seria mais um exercício com os "valores legais" do que uma virtude do magistrado.
Não é fácil admitir que o poder de julgar esteja subordinado a formas lógicas que podem ser reduzidas a expressões cibernéticas, mas é fácil entender que por mais subjetivo que seja o entendimento a conclusão - do ponto de vista judicial - é um sim ou um não, ou seja: o raciocínio pode ser subjetivo, ou analógico, mas a conclusão será sempre digital, na qual haverá correspondência biunívoca entre o 1 (um) e o SIM e entre o 0 (zero) e o NÃO.
É a natureza digital da conclusão que autoriza a redução dos argumentos à uma expressão também digital e permite ate mesmo a formação de uma equação e sua resolução ou demonstração através da Álgebra de Boole.
Os argumentos, ou provas dos autos, são de três tipos:
1. provas legais, ou que tem forma prescrita em lei, como a prova de estado da pessoa, sujeitas a descontituição por vício no ato formador;
2. provas cientificas, ou periciais, como a prova da causa da morte ou prova balística, sujeitas a descontituição por vício na origem ou sujeitas a contrariedade por outra prova científica, caso em que o magistrado ao se afastar de um laudo pericial deve se apoiar em outro;
3. prova lógica, ou demonstração, na qual os argumentos são ligados para suportar a conclusão.
Algumas coisas não são debatidas no processo penal por serem consideradas por demais óbvias, como por exemplo a inexigência da comprovação da morte civil por certidão do registro de óbito mas, de modo estranho em relação a outros argumentos a morte real é sempre referida - quando referida - ao laudo de folhas, raramente aparecendo na sentença algum extrato do laudo.
Do mesmo modo a confissão do acusado é referida em folhas, raramente aparecendo na sentença algum extrato
Laudo cadavérico e confissão são conteúdo dos autos tratados por simples referência folhas e folhas, salvo quando o conteúdo é trazido ao contraditório e se reflete no exame das teses, na sentença.
Deveras, o cotidiano revela no corpo das sentenças transcrições da denúncia e de depoimentos, verbo a verbo, como se tais conteúdos fossem se perder após o trânsito em julgado, ao mesmo tempo em que as disposições da sentença dirigidas à execução penal quando aparecem são ralas.
O discurso jurídico pode ser simplificado, tanto para juízes quanto para promotores, por aproximação das formas lógicas reduzidas nas quais o conteúdo e referido, ou seja, se um depoimento existe e é válido, em tese poderia ser referido como argumento "A" em folhas ou trazido de forma concisa, objetiva e clara, pois a certeza processual se revela ao operador como válido ou inválido, o que dispensa a transcrição verbo a verbo.
Sentenças de "mérito do crime" mais concisas, claras e objetivas, dado que o magistrado mostra como se convenceu, não precisando convencer os outros, serão não só mais inteligíveis (recorribilidade) como abrirão espaço para que os operadores dediquem mais tempo à formulação da pena e indicações para sua execução.
O tempo atual é o das garantias processuais, às quais o discurso jurídico longo e empolado serve para ocultar que não foram cumpridas ou para transformar o processo em "cavalo de carreira" pela demonstração de erudição.
As sentenças criminais condenatórias, como observei em toda a minha carreira, refletem tão bem o crime cometido que a pena acaba por ser assumir caráter secundário de inevitável consequência objetiva do crime.
Mas, o que satisfaz a vontade popular num pais de impunidade é a punição, não importa a que custo, dado que as garantias processuais não podem ser entendidas como aplicáveis quando as garantias fundamentais do cidadão comum não são efetivadas, ou como já me disseram muitas vezes, interrogando: porque criminoso deve ter tratamento "humano" melhor do que os humanos não criminosos.
Talvez a indagação reflita o sentimento de igualdade, por baixo, mas igualdade.
Imagem: autores.com.br
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