26 de outubro de 2012
PENAS VOANDO PARA TODO LADO
PENAS VOANDO PARA TODO LADO
por Serrano Neves
O plenário do STF está como um travesseiro estourado: é pena voando para todo lado.
Aguardei com ansiedade a fase de dosimetria, na esperança de que a culpabilidade, determinante da pena no art. 59 do Código Penal, recebesse o tratamento jurídico que lhe dispensa a doutrina.
Estou frustrado porque ouço fundamentos para a culpabilidade que forçam o teto para cima, quando os ministros avaliam as condutas com adjetivos que só ouvi em comentários à ações de bandoleiros e mafiosos, e cheguei a pensar numa culpabilidade "mais máxima" ou "culpabilidade plus", e até em "culpabilidade +" (o sinal de mais (+) significa, para as linguagens de programação, que o nível anterior foi ultrapassado).
O que ouvi posso tranquilamente interpretar (não ministro a ministro, mas no geral):
1) os ministros declararam que os condenados (denúncia procedente) tinham capacidade destacada para entenderem o ilícito de suas condutas e de determinarem-se com um comportamento de "não fazer", ao que se somam conhecimentos especializados de rotinas financeiras às quais alguns tinham o dever de manter em linha reta;
A isto eu dou o nome de IMPUTABILIDADE ESPECIAL, qual seja: aquela parcela da capacidade de entendimento e determinação que distingue o cidadão imputável-analfabeto da roça do cidadão imputável-culto da cidade, e mais ainda distingue o cidadão imputável-especializado que deve obediência a princípios.
2) os ministros declararam que os condenados (denúncia procedente), em razão da finalidade da trama de ilícitos, podiam discernir serem injustas as práticas que, ao meu ditado, chegam a confundir-se com concorrência política desleal.
A isto eu dou o nome de POTENCIAL CONSCIÊNCIA DO INJUSTO, qual seja: a capacidade para perceber que as práticas se desviavam da normalidade na qual outros administradores e cidadãos confiam existir. A traição da confiança é injusta.
3) os ministros declararam que os condenados (denúncia procedente), por suas posições de mando, comando ou decisão, tinha o dever de um agir conforme a dignidade, moralidade e importância do cargo, função ou posição.
A isto eu dou o nome de EXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA, qual seja: tinham o dever e a capacidade presumida de cumprimento do dever, sendo exigido que cumprissem o dever, ao invés de conduzirem-se de forma contrária ao dever.
Discorrido sobre os três elementos, o leitor pode aplicar os conceitos para julgar o agente político do mensalão (especializado) e o agente comum do trezoitão (simples mortal) e graduar a culpabilidade.
O agente do trezoitão atinge de modo direto a sociedade: rouba, mata, estupra etc. e tornas as esquinas um local de perigo para todos.
O agente do mensalão atinge de modo indireto a sociedade: rouba a confiança do cidadão, mata a esperança, estupra o voto etc. e torna as instituições um local de perigo para todos.
É possível que nossa cultura nos conduza a ter mais medo do trezoitão do que do mensalão, porque a conquista de bens e posição na sociedade nos exige mais esforço e tempo do que dispendemos para a construção da sociedade livre, justa e solidária.
Uma velhinha roubada ou uma criança estuprada nos causa mais revolta do que uma instituição derruída.
O PCC matando policiais atemoriza mais, bem mais, do que políticos matando verbas para a saúde e educação.
O comentário em derivação do tema é para reafirmar minha posição de que magistrados e membros do Ministério Público assumiram posição no rol de vítimas em potencial da criminalidade imediata e pensam como pensa o comum dos mortais.
A culpabilidade dos condenados (denúncia procedente) no mensalão foi descrita à exaustão em seus elementos, embora fora do contexto do art. 59, mas tal descrição pode ser carreada (como gostam de dizer os juristas) para a dosimetria, onde fundamentarão que a culpabilidade aponta para o máximo.
Culpabilidade máxima não combina com penas próximas do mínimo nem abaixo da média.
E o raciocínio é leigo, e vem dos antigos (bota 50 anos ai para escapar do Ibama) caçadores mineiros das Minas Gerais: "Para jacu (ave nobre) pólvora inglesa, para inhambu (ave comum) pólvora piquete."
E ai, é pena que voa para todo lado, despregadas do corpo penal, ao sabor do vento do subjetivismo desfundamentado que é caracterizado pelo "eu acho" ou "eu penso".
Magistrados não acham nem pensam, magistrados devem expor fundamentos e decidirem para, em primeiro lugar cumprirem a Constituição, e em consequência deste cumprimento assegurarem toda a extensão da recorribilidade (no caso embargos de declaração).
Sustento com tranquilidade que uma pena fixada sem a devida declaração do grau de censura fundamentado viola o devido processo legal constitucional que recepcionou a "medida da culpabilidade como determinante da pena.
Sustento, ainda sem dispor a argumentação adequada, que a ausência de declaração da "medida da culpabilidade" é uma obscuridade ou causa legal oculta.
Prato fundo cheio para a defesa, dado que o modo como a dosimetria está sendo disposta pode, no mínimo, lançar o trânsito em julgado para depois do Natal (de que ano não posso prever).
Não sou Advogado no mensalão, sou Advogado do DEVIDO PROCESSO LEGAL FORMAL E SUBSTANCIAL, conforme exigido pelo ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO.
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